sexta-feira, 9 de maio de 2025

Entre medalhas e escombros: a história de Júlia, uma atleta que não se entregou à enchente no RS


Em maio de 2024, quando as águas tomaram Porto Alegre, não foram apenas casas e objetos que se perderam — muitos sonhos quase foram levados junto. Mas Júlia Martins de Paula, uma menina de apenas 13 anos, decidiu que o dela não seria um deles.

Ela e a mãe, Leticia, viviam num pequeno apartamento térreo no centro da cidade, uma das áreas mais afetadas pela maior enchente da década. Quando a água começou a invadir a rua, mãe e filha fugiram com nada além da roupa do corpo. Abrigaram-se no Centro de Treinamento Esportivo do Estado (CETE), que naquele momento se transformava num porto seguro improvisado para centenas de famílias desalojadas.

Lá, em meio ao caos e à incerteza, Júlia encontrou força onde muita gente apenas veria desespero. Apaixonada por esportes desde os cinco anos, ela já havia se aventurado pela ginástica artística, natação e levantamento de peso olímpico (LPO). Mas foi durante os dias difíceis no abrigo que descobriu o judô — e com ele, um novo fôlego.

— No início eu fiquei com medo. Vi muita gente chegando chorando, sem saber o que fazer. Mas conforme os dias passavam, percebi que não estávamos sozinhos. O Brasil inteiro estava olhando pra gente — contou Júlia, lembrando como os corredores do CETE, mesmo cheios de colchões e sacolas, começaram a parecer mais acolhedores.

Mesmo sem roupas próprias para treino, sem alimentação ideal ou qualquer conforto, ela persistiu. Conquistou amizades, foi incentivada por voluntários e colegas abrigados e, acima de tudo, nunca parou de se mover. Quando o Ginásio Tesourinha — onde costumava treinar — foi também atingido, ela se adaptou. Com cuidado, adiou os treinos de judô para não se lesionar e comprometer sua participação no Campeonato Brasileiro de LPO.

E a decisão valeu a pena: cinco meses depois de perder tudo, Júlia subiu ao pódio e trouxe para casa uma medalha de bronze no LPO, categoria sub-17. No início de 2025, mais uma conquista: bronze na Copa Sapiranga de Judô. Tudo isso, sem patrocínio, sem apoio financeiro, com o único auxílio de uma bolsa que cobre as mensalidades do clube e um cartão de transporte público.

Hoje, Júlia e a mãe vivem na Ocupação Residencial Arvoredo, num antigo hotel desativado transformado em abrigo permanente. Ainda não conseguiram ser contempladas por nenhum programa habitacional, mas têm água, luz e o mais importante: esperança.

Leticia vive para a filha. Sem trabalho fixo, dedica-se a acompanhá-la em cada treino, em cada competição. “Se eu não levar, ela não tem como ir. E o esporte é o caminho dela, o futuro que eu quero ver acontecer”, diz.

A vida da Júlia não é de contos de fadas. É marcada por perdas, improvisos e obstáculos diários. Mas é também uma história de força, de alguém que — mesmo tão nova — já aprendeu a não desistir quando a correnteza parece mais forte.

(Com informações da Lance)


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